Big data, inteligência artificial e ética dos dados
É difícil imaginar uma tecnologia que, atualmente, independa do uso de dados pessoais. Até mesmo um simples hábito, como a compra online, decorre da entrega de informações relevantes a empresas que as utilizam para vender cada vez mais produtos. Afinal, para um negócio se destacar na grande vitrine do mundo digital, ele precisa criar experiências personalizadas, entregando produtos diferenciados para perfis específicos de clientes. E para entender cada perfil, é preciso coletar e processar tantos dados quanto necessário para a definição do público-alvo. Via de regra, quanto mais dados forem coletados, maior é a vantagem competitiva e a precisão de vendas de uma empresa. Pelo menos até ela esbarrar em questões éticas e legais.
O que os dados podem entregar?
Da mesma forma em que as informações indicam caminhos de venda para as empresas, elas também podem revelar o estilo de vida de determinado consumidor, como padrão de vida, permitindo práticas de crimes por pessoas mal-intencionadas. Essa é uma das implicações da coleta excessiva e do tratamento inadequado de dados pessoais.
Muito se fala em proteção das informações coletadas e prevenção contra vazamentos, mas o uso ético dos dados deve ser considerado ainda antes. É importante entender quais dados realmente são necessários para atender ao objetivo almejado e se essas coletas valem os possíveis contratempos. Por exemplo, de nada adianta ter inúmeras informações para traçar seu público-alvo sob o risco de vazamentos e de quebra de confiança do consumidor. Ou, ainda, de nada adianta anonimizar os dados se o cruzamento entre eles identifica seu cliente.
A Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais existe, está em vigor e tem entre seus objetivos o de evitar incidentes nas empresas e exposições indevidas de informações pessoais. Estar adequado às exigências da lei é importante, mas pode-se ir além. Não é porque a lei permite determinadas condutas que elas devem ser realizadas sem um estudo, uma estratégia e um planejamento. O uso ético dos dados é pensar não apenas na questão legal como também moral.
Oversharing, a cultura do compartilhamento
A partir da presença massiva da web 2.0 e do hábito de compartilhar quaisquer dados sem a devida cautela, estamos criando máquinas e inteligência artificial totalmente dependentes do big data. Atualmente, é possível moldar escolhas e decisões dessas novas tecnologias pela análise de inúmeras informações coletadas. O problema é avaliar as devidas responsabilidades quando, por exemplo, um veículo autônomo tem em sua base de dados duas únicas alternativas: frear bruscamente e colocar em risco a integridade física de seus ocupantes ou seguir e atropelar um pedestre que acabou de surgir na sua frente.
O uso das informações por essas novas tecnologias e suas consequências também são objetos de estudos da ética dos dados.
Eticamente falando
O primeiro passo para tratar as informações pessoais de forma ética é entender que as tecnologias não são as responsáveis por danos como vazamentos, algoritmos racistas ou modulação dos resultados na entrega de anúncios online. Não é o que a tecnologia em si faz, mas com quais informações ela faz. Ou seja, quais dados as empresas coletam? Para quê? Onde e como serão usados? Como garantir a privacidade dos titulares?
Pensar em toda a trajetória dos dados, desde a coleta até a eliminação, por meio de planejamento consistente e estratégia adequada, é uma atitude ética para com as pessoas, além de uma demonstração da responsabilidade profissional da companhia. Ainda, estabelecer diretrizes de comportamentos em códigos de conduta, criar comitês de ética e de LGPD também conduzem a empresa na direção do uso ético dos dados.